O
objetivo deste texto é apresentar, primeiramente, uma analise acerca da teoria
Funcionalista e a partir dela estabelecer os meios de compreensão referentes
aos pressupostos Neo-funcionalistas, que a sucederam enquanto teoria
explicativa da realidade.
O
Funcionalismo tem como principal pensador David Mitrany, o qual se dedicou a
entender o processo de integração partindo de uma observação acerca do caso
europeu. Sua principal preocupação sempre foi a obtenção da paz em nível
mundial, acreditava sobretudo na positividade da cooperação entre os Estados
Nacionais como meio para garanti-la, a pesar de identificá-los como causador da
guerra. O autor entende que em um ambiente que se apresente uma problemática
comum, identificada como mínimo denominador comum entre os Estados, estes
tenderiam a cooperar em torno desta questão afim de generalizar os custos e
reduzir os riscos, por meio disto podemos identificá-los como atores racionais.
Como
atores do sistema, Mitrany identifica os próprios Estados - enquanto estância
intergovernamental; e as Instituições e Organizações Internacionais - como estância
supranacional. O sistema internacional seria apontado como um meio no qual os
atores, mediante suas preferências individuais, atuariam e se comportariam de
forma racional, ele seria aberto à interferência de todos os seus componentes e
apresentaria uma seria de relações de trocas entre seus subsistemas sociais
(política, economia e sociedade).
E
como surgiria a cooperação? Podemos identificar que o cenário favorável ao seu
surgimento, segundo o Funcionalismo, seria em um contexto no qual os problemas
técnicos se mostram crescentes e que a solução não se mostra de viável no
âmbito nacional, o que forçaria os Estados a estabelecer uma cooperação tópica.
Essa cooperação daria origem a uma integração institucional regional acerca de
um tema técnico, que demandaria a atuação de especialistas. Essa instituição
supranacional seria administrada por uma burocracia técnica transnacional,
esses seriam os agentes da integração.
Como
a integração teve como motor inicial uma questão técnica, ao empregar
mão-de-obra especializada para resolução do problema inicial o seu sucesso
seria garantido e os frutos dessa integração inspirariam a cooperação em outras
áreas problemáticas, gerando assim um processo de proliferação da cooperação
para outras áreas, o que Mitrany nomeia como Doutrina da Ramificação – a
colaboração tópica funcional referente a um setor geraria um encadeamento de
cooperação até mesmo para áreas mais complexas como a política e a economia.
Continuando
na onda de positividade cooperativa, esse processo de Ramificação que surgiu em
uma Atividade Funcional específica, produziria um processo de criação gradual
de outras Instituições Internacionais produzindo uma Rede Internacional de
cooperação, que redefiniria os interesses e as lealdades dos Estados,
mudando-as do interesse nacional para o interesse coletivo. Esse processo
geraria uma nova forma de comportamento dos Estados que seria internalizada e
observaríamos a redução progressiva dos conflitos internacionais. Então haveria
um processo de integração contínuo e perene, uma cooperação iniciada jamais
retrocederia.
Mas
como toda teoria apresenta falhas, o Funcionalismo, também possui as suas. A
primeira crítica, se dá em relação a sua origem e objetivos, por ter sido
criado por meio da observação do processo europeu de integração, a teoria não
foi capaz de explicar porque em certos momentos o processo foi interrompido e,
até mesmo, o porque de em certas áreas as iniciativas forem má sucedidas (como
por exemplo a integração militar). Quanto aos objetivos, a teoria funcionalista
é entendida como um método para pensar a integração, um receituário que
apresenta o “dever ser” de um processo, não o que ele realmente é. Outro ponto
de inflexão é o fato da teoria não ser capaz de apontar especificamente quais
são as condições necessárias para que a cooperação, motor inicial do processo,
se estabeleça. O que é reforçado pelo apontamento de que ainda não assinala as
razões pelas quais os Estados, seus processo internos e atores nacionais,
decidem pela integração.
Por
meio da crítica construtiva dos pontos de inflexão da teoria Funcionalista
surge o Neofuncionalismo de Haas, Keohany e Nye, os quais buscaram superá-los e
apresentar uma teoria nova e capaz de explicar os novos processos que passaram
a ser observados a partir da década de 1950, mas sobretudo a teoria
Neo-funcinalista pretende ser uma teoria geral. 
Partindo
da análise dos atores para esses teóricos temos, a manutenção do principio de
racionalidade e a busca por generalizar despesas e reduzir riscos. Quanto aos
componentes sistêmicos teríamos agora uma consideração dos processos nacionais
internos e regionais, ao invés de considerarmos os burocratas, técnicos e
especialistas (como para o Funcionalismo), temos a valorização da atuação dos
governos nacionais, partidos políticos, grupos de interesses, elites e
organizações sociais.
Partindo
do principio que a base para o processo muda – passa a ser atores nacionais;
temos com isso uma regionalização do processo, devido a proximidade geográfica
e cultural entre os atores de uma mesma região, a unidade integracionista ganha
uma nova configuração. Agora compreende-se a existência de avanços e retrocessos
nos processos de integração, justificando-os pela mutabilidade do interesse
nacional, das suas elites e grupos de interesses.
Considerando
que os atores se relacionam mais intensamente com seus vizinhos geográficos por
esses apresentarem vantagens geográficas, culturais e de afinidade de
interesses, o motor da integração institucional supranacional deixa de ser a
cooperação técnica tópica e o intergovernamentalismo para ser a cooperação
regional. Onde há uma transferência de expectativas e lealdades, assim mais bem
justificada que a do Funcionalismo, da unidade Estatal para a Institucional
Regional.
Para
Haas, os atores apresentariam como motivações para implementar processos
integracionistas quatro principais pontos:
·        
desejo de promover a segurança numa dada
região, realizando a defesa conjunta contra uma ameaça comum;
·        
promover a cooperação para obter
desenvolvimento econômico e maximizar o bem-estar;
·        
interesse de uma nação mais forte em
querer controlar e dirigir as políticas de seus aliados menores, por meio de
persuasão, de coerção ou de ambos;
·        
a vontade comum de constituir a
unificação de comunidades nacionais numa entidade mais ampla. (MARIANO &
PASSINI, 2002)
Partindo
ainda do princípio Funcionalista de cooperação inicial tópica como motor para o
processo de integração, temos que a iniciativa de se promover a integração
parteria de um núcleo funcional prévio constituído por governos regionais e
burocracias especializadas. Este por sua vez provocaria estímulos a integração
regional promovendo a adesão de novos atores regionais e setores sociais para
adensar o processo.
Por
meio destas características e efeitos, os autores preveriam que o processo
antes tópico apresentaria tão bons resultados que se expandiria, espraiaria,
para outros setores. Como ponto central do Neofuncionalismo, temos a manutenção
“repaginada” do conceito de Ramificação, agora concebido enquanto Spill-over
(traduzido enquanto espalhar e transbordar), que produz um efeito de sempre
estar criando novas demandas nos mesmos setores e em novos, gerando reações e
respostas aos processos. O spillover atuaria de forma sistêmica, com
reverberações internas em todos os componentes setoriais da integração, que se
aprofundaria até o campo político. O processo de spill-over se daria tão intensamente
que forçaria até mesmo a criação de uma burocracia específica para gerenciar os
processos integracionistas. 
Considerando
os processos nacionais de integração regional, o Neo-funcionalismo, acredita
que o papel da democracia é essencial para que eles se façam viável, já que
toda a população precisa concordar com o processo integracionista e o seu
sucesso depende da participação de toda a sociedade nele. Não se entende
integração se a sociedade como um todo a não vê benefícios nela, já que com a
integração cria-se um deslocamento de lealdade do polo nacional para o
regional, deixa-se de prestar dedicação exclusiva as questões nacionais para as
questões de bloco.
Assim,
entende-se que a principal contribuição Neo-funcionalista se refere aos
processos de Spill-over e a sua compreensão regional-mundial de evolução
integracionista. Porém até mesmo esses pontos, bem fundamentados, não se
mostram passíveis de críticas. Com esse foco excessivo no spill-over a teoria
passou a assumir um caráter linear que não se apresenta na realidade, nem mesmo
no estudo de caso que fazem com o processo europeu. Como criticam, até mesmo
Keohane e Nye, não se pode basear toda a teoria em uma única causa, há que se
considerar as diferentes formas de evolução da cooperação e como resultado
delas possíveis formas de institucionalização, diversas das já apresentadas.
Como
solução para esses pontos Keohane e Nye apresentam quatro dimensões para se
entender a integração:
·        
a amplitude geográfica compreendida por
esse regime internacional, ou seja, o seu alcance físico;
·        
a hierarquia dos temas dentro da agenda
de negociação e de coordenação de políticas [high e low politics];
·        
os tipos de instituições que realizam a
tomada de decisão, a implantação e o fortalecimento do processo;
·        
o direcionamento e a magnitude dos
ajustes políticos realizados nacionalmente em consequência da integração [...].
(MARIANO & PASSINI, 2002)
Quando
se considera esses pontos sugeridos pelos autores a compreensão
neo-funcionalista se mostra muito mais completa e capaz. A aplicação da teoria
em casos reais depende em grande medida dessas adaptações propostas por eles. A
teoria Neo-funciolista assim como sua antecessora se mostra muito específica em
relação a aplicabilidade, o que é sua principal falha, mas sua validade e
importância ainda permanecem.
 
 
  | 
Pressupostos da Teoria Funcionalista | 
Relação entre os pressupostos e o debate sobre
  integração regional | 
  | 
O Estado atua racionalmente | 
O
  Estado é um ator racional que sempre buscará atender os seus interesses
  nacionais e coopera em questões tópicas, as quais não lhes é benéfico atuar
  sozinho. | 
  | 
Positividade da integração | 
A
  integração em última instância promover a paz mundial e é positivada pelo
  discurso funcionalista, uma vez que promove benfeitorias, cooperação e reduz
  custos. | 
  | 
Atores da integração | 
Os
  únicos atores promotores da integração são aqueles que surgem no contexto da
  cooperação técnica tópica. A Burocracia técnica e os especialistas. | 
  | 
Doutrina da Ramificação | 
Parte
  de uma Atividade Funcional (oriunda de uma cooperação técnica) que gera bons
  resultados e promove a proliferação da cooperação em outros campos. | 
  | 
Pressupostos da Teoria Neo-funcionalista | 
Relação entre os pressupostos e o debate sobre
  integração regional | 
  | 
O Estado atua racionalmente | 
O
  Estado é um ator que atua racionalmente mas é compreendido enquanto um
  conjunto de grupos e processo internos de tomada de decisão. Obedece à seus
  interesses nacionais para integrar, mas também parte de uma questão
  específica técnica para cooperar, pois os custos de superação dela quando
  regionalizados são menores. | 
  | 
Positividade da integração | 
A
  integração em última instância promove a paz mundial, a integração dos povos
  e a transferência de preferências, do nacional para o interesse comum. | 
  | 
Atores da integração | 
A
  iniciativa da integração parte dos governos nacioanais, mas observa-se a
  atuação das elites, grupos de interesses, organizações sociais e partidos
  políticos. | 
  | 
Spillover | 
O
  conceito de Spill-over é o motor da integração, corresponde a praticamente o
  mesmo de Ramificação para o Funcionalismo mas apresenta muito mais
  importância e profundidade para o Neofuncionalismo do que para sua
  antecessora.  | 
 
Bibliografia                                                             
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acesso em: 07 de março de 2013